Que vivemos na “era da judicialização da Medicina”, não temos dúvidas. É certo que o paciente precisa ter autonomia para a sua tomada de decisões, por isso é tão importante o cumprimento do dever informacional por parte do médico de forma clara, simples, objetiva e sem uso de expressões técnicas rebuscadas.
O prontuário é documento único constituído de um conjunto de informações, sinais e imagens registradas. Estas geradas a partir de fatos, acontecimentos e situações sobre a saúde do paciente e a assistência a ele prestada. Sendo de caráter legal, sigiloso e científico, o que possibilita a comunicação entre membros da equipe multiprofissional e a continuidade da assistência prestada ao indivíduo.
O artigo 87 do Código de Ética Médica, a propósito, dispõe que é vedado ao médico deixar de elaborar o prontuário legível para cada paciente. Seus requisitos de validade são a autenticidade, integridade e tempestividade.
Alguns requisitos são primordiais para a sua elaboração:
Saliente-se que a não elaboração de prontuário consiste em infração ética. E não só isso, caso haja um processo judicial em face do médico, este pode não conseguir comprovar que atuou com a diligência e terapêutica necessárias para aquele paciente, culminando com a sua condenação em face de tal situação.
O prontuário é documento de primordial relevância, vez que pode se apresentar como instrumento de defesa ou de acusação. É por meio dele que se poderá provar que o médico utilizou de todos os cuidados de forma adequada, cumprindo com o seu dever informacional naquele caso concreto.
Em caso de registros omitidos ou preenchidos de forma incompleta, haverá uma maior dificuldade por parte do profissional de comprovar que agiu em conformidade com os seus deveres.
Deste modo, ato médico deve ser ato efetivamente registrado em prontuário médico, sendo certo que o preenchimento satisfatório desse documento trará benefícios a todas as partes.
Com os avanços tecnológicos, hoje é muito comum a utilização do prontuário eletrônico, que consiste em um sistema projetado para apoiar os usuários, fornecendo acesso a um completo conjunto de dados, alertas, sistemas de apoio à decisões e outros recursos, como links para bases de conhecimento médico.
Nesse ponto, há que se ressaltar que não se trata de prontuário digitalizado, o qual consistiria em uma mera cópia. Deste modo, para que a modalidade eletrônica tenha efetivado seu nível de garantia de segurança, deve haver a assinatura ou certificado digital (Lei 13.787/2018 e Resolução 1821/2007 do CFM).
É dever do médico guardar o prontuário, seja na clínica ou em instituição em que assiste o paciente, ciente de que se trata de documento sigiloso, sob o qual o médico possui dever de guarda, no entanto, a propriedade dos dados ali registrados é do paciente, de sorte que o médico não pode sem o consentimento deste, revelar o seu conteúdo, em conformidade com o que ensina no artigo 1º da Resolução 1605/2000.
Sob essa ótica, é vedado ao médico, conforme aduz o artigo 89 do CEM, é vedado ao médico liberar cópias do prontuário sob sua guarda, exceto para atender a ordem judicial, ou para sua própria defesa, assim como quando o paciente o autorize por escrito.
Em face disso, deve-se esclarecer que eventual entrega de prontuário, face as suas especificidades, deve ser precedida de termo de entrega do prontuário. Sendo necessário ainda que o paciente, terceiro ou representante legal, apresentem requisição expressa do prontuário do paciente, indicando o motivo da solicitação.
Some-se a isso, o fato de que havendo a retirada deste por terceiros, deve haver o preenchimento de um termo de compromisso e confidencialidade.
Uma peculiaridade desta questão, ainda, é que o tempo de guarda e eliminação do prontuário deve ser de 20 anos a partir do último registro, conforme diz a Lei 13.787/2018 e Resolução 2218/2018.
Embora esta seja a determinação legal, a recomendação é que a guarda seja feita ad eternum, havendo a digitalização ou microfilmagem destes, até como medida paliativa para a eliminação do papel, ciente do dever de segurança digital para o arquivo eletrônico.
Trabalhamos em equipe e isso é essencial para lembrarmos que os outros profissionais de saúde têm suas responsabilidades na elaboração e no sigilo sobre os prontuários dos pacientes. Por exemplo, a Enfermagem é quem mais manuseia esse documento e tem suas anotações regidas por suas resoluções. Infrações podem incorrer em processos éticos e judiciais também.
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A Equipe AwakeMed agradece o excelente artigo à
Gabriela Azevedo Varela | @g.azevedov
Advogada especialista em Direito Médico e da Saúde pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – USP
Pós-graduanda em Direito Médico pela PUC/PR